Black bloc era a tendência da moda em 2013, com direito a fantasia de carnaval própria, “filosofia da marca” e, claro, um arsenal de armas mais ou menos caseiras para detonar a praça pública. Deixando de lado toda a glamourização construída em torno do símbolo, era o espetáculo de uma “cambada de badernistas”, expressão do professor de direito Gilmar, interpretado por Gil Brother, o Away de Petrópolis. Antes que o fenômeno pudesse ser mais profundamente compreendido, aquela estética modelada pelo senso mais tosco possível, já irradiava como gás venenoso pelo país, dando ocasião ao repúdio vindo de todas as partes. Os únicos deslumbrados com a performance macabra, além dos próprios vândalos, eram os estudantes e professores infantilóides de humanas.
Pirotecnia, aquela palavra gasta por Lula para adjetivar a operação de sua condução coercitiva pela PF, é a essência da mensagem revolucionária. Se há coisas explodindo, vidraças estilhaçadas, pedras atiradas na polícia, e se possível algum inocente morto em meio ao caos, então se alcançou o topo do Everest do tesão marxista juvenil. É a consumação do desejo irrealizável por via do chamado “pensamento mágico”. Por pura analogia imaginária, atacar concretamente um representante da lei, a propriedade de uma grande empresa ou banco, um monumento público, é uma maneira de brincar de destruir o capitalismo, o estado, a sociedade patriarcal, a civilização ocidental, êxtase que só pode ser obtido via fantasia.
Militantes, por definição, não pensam, mas manejam discursos, verdadeiros tagarelas que são, diga-se. Curiosamente, a total ignorância de jornalistas, intelectuais e políticos, produziu leituras padronizadas acerca do que se passava. O “equívoco” mais comum era levar a sério tais grupos e ações tão brutais quanto vazias de consciência política. Em muitos dos casos, o entusiasmo era a de garoto-propaganda de organizações com seus ideais vomitados para justificar toda aquela “aparente” estupidez de jovens alienados. O outro erro-clichê foi o de ignorar a ladainha “anarquista teen”, interpretando a função e relação dos black bloc com as manifestações como um todo na base da pura imaginação. Os palpites variavam entre culpar a polícia, cuja violência levantou mártires dispostos a defender heroicamente os manifestantes da repressão fascista, ou que eram infiltrados oriundos de grupos imaginários para deslegitimar o movimento, ou que “são de direita pois usam máscara” segundo um sábio no Roda Viva.
Se tomarmos “reacionário” com o sentido de alguém que manifesta aversão radical a toda violência revolucionária, por estúpida além de destrutiva, 2013 foi o boom do sentimento reacionário. Antes que “de direita”, quer liberal quer conservadora, a reação tem seu valor e poder contidos em sua pura negatividade. Não importa quais melhores doutrinas políticas e econômicas nem quais os melhores partidos ou candidatos, o espetáculo da fúria e da barbárie é rechaçado pelo mais elementar bom senso, já extinto entre muitos jornalistas e intelectuais.
Não se trata aqui de qualquer pacifismo obtuso, ou ingenuidade de senso comum (“falsa consciência”). Perguntas pela causa e pelo efeito da insanidade de grupos ativistas, tanto inconsequentes para com a vida alheia quanto suicidas, ocorrem espontaneamente ao raciocínio diante de cenas e notícias lamentáveis. Os motivos ideológicos, reduzido vagamente àquele impulso “anti-capitalismo” conforme a “vanguarda” nos últimos duzentos anos, provam a total insuficiência intelectual dos jovens espalhafatosos, o que lhes impede o mínimo entendimento crítico da política ou tampouco de terem autonomia em sua organização e tática de suas ações. O caos social como um fim em si mesmo e a brutalidade tornada propaganda ideológica não podem seduzir senão um restrito grupo de acéfalos, cegos que são para a evidente teatralidade de uma rebeldia juvenil fabricada em escala industrial. Portanto, não faltou recheio para matérias sensacionalistas, na imprensa e na TV, a violência foi fonte inesgotável de imagens de enorme impacto, sem que viessem acompanhadas de uma simples ideia digna de tanto barulho.